sexta-feira, 25 de junho de 2010

Melhor Idade




Já não sinto força nos pulmões para apagar aquelas velas chafurdadas no bolo árido, regado a granulados—Droga! Sempre lembro de cocos de rato—Tampouco tenho saco para agüentar os trocadilhos débeis e óbvios dos meus amigos, que dizem:
—Fazendo sessenta e nove, hein? Tá na melhor idade!
Claro que é melhor idade, não tem outra.

 Eu sou assim mesmo. Agridoce. O humor ácido mesclado a um sentimentalismo barato. Se bem que ultimamente tenho andado azedo. Perdi o encanto pela humanidade, embora aprecie suas obras. Não é a toa que no livro de Gênesis diz que Deus criou o homem sua imagem e semelhança e logo depois se arrepende da sua criação fazendo um grande ensopado. Mas o divino é muito temperamental mesmo, Nota-se pela criação ornitorrinco.

Bem... Minha vida já não é mais a mesma desde que Marie partiu. Meus únicos companheiros são o Dr. House, que assisto fielmente acompanhado de Jack, Jack Daniels— esse sim à medida que envelhece fica melhor. Algumas fotografias ornam a sala, onde os imbecis que estão a me homenagear distribuem digitais e comentários sobre elas. Ás vezes sento-me à escrivaninha em busca de alguma história e martelo minha Ollivetti Lettera verde presenteada por Marie há uns trinta anos, apesar de ter um lap top.  Normal essa rabugice nostálgica na minha idade. E falando em presentes chego a suar frio imaginando os presentes bizarros que virão. Meias beges e marrons, controle remoto universal com números gigantes, ou algumas dessas ferramentas idiotas anunciadas na TV que prometem trocar o filtro de óleo do motor, bater uma vitamina e abrir uma garrafa de vinho. Fala sério...

Todos na minha festa parecem se divertir, menos eu. Os assuntos em pauta não são em nada atrativos para mim, pontes de safena, remédios tarja preta e uma enciclopédia de A à Z de doenças e claro, com o advento da pílula azul, uma enxurrada de mentiras de cunho sexual. Nessas horas até que me cairia bem um Mal de Alzheimer. Contudo é bom ver a infantilidade senil dessas figuras que compõe meu cotidiano. É uma jazida de besteirol da vida para fomentar alguma escrita esdrúxula e fatídica na ausência de criatividade. No fundo eu gosto. Não dou o braço à torcer para sustentar essa minha distimia crônica; me torna caricatura de mim mesmo.

Bem...chega de elucubrações patéticas e divagações filosóficas. Foi só para eu tomar um fôlego e voltar às velas.

—Aha, uhu, o Vicente eu vou comer seu bolo!

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